segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Rolezinho, consumismo e racismo

Então tá ... existe outra sociedade que não seja de consumo, estruturada por meio de consumo, constituída por consumo, permeada por consumo? Sociedade de consumo é a sociedade contemporânea. Não há outra! Por que o preconceito - no sentido estrito da palavra - a respeito de consumo? Parece ser mais nobre tratar de produção ...

Durante os últimos dias, em muitas oportunidades, tanto nas redes sociais virtuais, quanto em diferentes meios e veículos da imprensa, procurou-se colocar no consumo - especificamente, no consumismo - e não no racismo, parte importante do foco do debate sobre os rolezinhos em shopping centers. Consumismo, nesse caso, tem sido tratado de modo difuso e impreciso.
 
Com efeito, uma das faces da questão é que enquanto racismo é menos palatável à discussão, consumismo, por sua vez, parece perfeito, pois, em tese, está contemplado no espaço do shopping. Difuso e impreciso, porque tende a ser tratado por meio de crítica pouco elaborada, quase lugar comum, em que, via de regra, há sempre alguém a apresentar objeção ao comportamento de compra, e ao objeto da compra, no espaço do shopping center.
 
O fenômeno atualmente em curso enreda noções de consumo e sociedade de consumo para além daquela de consumismo, mais imediata. Aparentemente, o consumismo é o pano de frente e o racismo é o pano de fundo, ou melhor, o fio condutor, posto que atrás da pele parda ou negra há maior possibilidade de vinculação a uma renda inferior e, portanto, a uma condição de frequência a priori não prevista por shopping centers.
 
De modo complementar, o espaço do shopping tem um argumento quase que impositivo à avaliação pejorativa do rolezinho, algo como alguém questionar o porquê de não se promover um rolezinho em uma biblioteca ou em um hemocentro, por exemplo. Sob esse aspecto, o uso do conceito de consumismo é ainda mais impreciso, posto que obscurece a inserção no debate da noção de consumo como forma de reprodução, mediação social, diferenciação social ou mesmo expressão da subjetividade humana.
 
Referências Conexas
 
Barbosa, L., & Campbell, C. (2006). Cultura, consumo e identidade. Rio de Janeiro: Editora da FGV.
 
Lamont, M., & Molnar, V. (2001). How black use consumption to shape their collective identity. Journal of Consumer Culture, 1(1), 31-45.
 
Pinheiro-Machado, R., & Scalco, L. M. (2012). Brand clans: consumption and rituals among low-income young people in the city of Porto Alegre. International Review of Social Research, 2(1), 107-126.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Vinhos e amores no Sertão


A minissérie Amores Roubados que a Rede Globo exibe desde 6 de janeiro é contextualizada no sertão nordestino, entre as cidades de Petrolina, em Pernambuco, e Juazeiro, na Bahia. Baseada no livro A Emparedada da Rua Nova, do autor pernambucano Carneiro Vilela, a minissérie tem o seu enredo desenvolvido em torno do agronegócio erguido às margens do Rio São Francisco, especialmente das vinícolas lá instaladas. Em abril do ano passado, a companhia áerea Gol publicou uma revista de bordo com uma matéria apresentando a rota do vinho do Vale do São Francisco. As fotos que ilustram esse post foram feitas dessa revista, à época. A minissérie, com produção e direção acima da média da programação usual da TV brasileira, ajuda a despertar a atenção para o mercado e o consumo de vinhos no Brasil - consumo esse que mais do que dobrou nos últimos 10 anos e atingiu a marca de mais de 170 milhões de litros por ano.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Boxing Day


Black Friday, Halloween e, agora, o Boxing Day. Viva a globalização, viva a capacidade do sistema capitalista em expandir seus mecanismos de reprodução e viva, também, a capacidade que o brasileiro tem de imitar, aculturar-se, copiar ou, como diriam los hermanos argentinos, macaquear.

Não somos anglo-saxões e muito menos fazemos parte do Commonwealth, mas empresas brasileiras como o Submarino, por exemplo, tentaram adotar o Boxing Day para alavancar vendas nos dias imediatamente após o Natal, período considerado de baixa vendagem no varejo. Já outras empresas, como a Vivara, apostaram em algo mais do que um único dia. Criaram a Boxing Week, anunciando preços com descontos de até 50% para compras no período entre o Natal e o Ano Novo.

Do mesmo modo que a Black Friday e o Halloween, o Boxing Day possui relação com tradições religiosas cristãs, mas que não foram construídas aqui no Brasil – ainda majoritariamente católico. Não obstante, em tempos de globalização e pós-modernidade, hábitos e costumes parecem ser produzidos e reproduzidos culturalmente em uma velocidade jamais vista anteriormente. E isso ocorre, inclusive, dentro do senso de oportunismo empresarial para promover o consumo.
 
Referências Conexas
 
Okleshen, C., Baker, S. M., & Mittelstaedt, R. (2011). Santa Claus does more than deliver toys: advertising’s commercialization of the collective memory of Americans. Consumption Markets & Culture, 4(3), 207-240.
 
Thompson C. J., & Tambyah, S. K. (1999). Trying to be cosmopolitan. Journal of Consumer Research, 26(3), 214-241.
 
Trentmann, F. (2009). Crossing divides: consumption and globalization history. Journal of Consumer Culture, 9(2), 187-220.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Retrospectivas e maratonas

Os finais e inícios de cada ano são repletos de retrospectivas em jornais, revistas e canais de televisão. Há uma oferta quase que interminável de frases, imagens e fatos que, na perspectiva da grande mídia, marcaram o ano. Um leitor regular de jornais e revistas não tem muitas opções diferentes nas publicações. Tornou-se um lugar comum apresentar retrospectivas e reproduzir acontecimentos. Parece ser algo conveniente para a imprensa, pois trata-se de uma produção editorial que pode ser preparada com uma certa antecedência e, de algum modo, pode representar uma espécie de folga nas redações para que equipes de trabalho, digamos assim, aproveitem as festas de fim de ano. Em todo caso, as retrospectivas podem, ao fim e ao cabo, ser úteis como um registro, uma síntese histórica do que aconteceu em determinado ano, ainda que seja necessário um certo critério ao se olhar tais registros.

Além das retrospectivas, as emissoras de televisão também lançam mão do expediente da chamada maratona. Horas e horas de exibição contínua de uma programação com um tema, gênero, diretor ou ator em comum. Os canais de TV por assinatura são os que mais ofertam maratonas aos seus telespectadores. Entre outras coisas, sugerem uma maneira de reduzir custos com a renovação e lançamento de nova programação no período. Tais maratonas são um verdadeiro convite para que alguém abdique do pensamento e permaneça em estado de letargia diante da TV, consumindo horas e horas de uma mesma coisa. De uma forma e de outra, a chamada grande mídia empreende um processo de reprodução cultural que é largamente consumido, em que pesem as festividades de fim de ano, o verão e as férias escolares.

Referências Conexas

Bourdieu, P. (1997). A televisão. Rio de Janeiro: Zahar.

Bourdieu, P., & Passeron, J-C. (2008). A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio de janeiro: Vozes.